terça-feira, 19 de novembro de 2013

Adeus ao Mariano

Pouco a pouco, Mariano se aninhou em meus braços. Seu peito definido, seus músculos rijos como pedra em contato com o meu. Passou as mãos nos meus cabelos e desceu até o lóbulo da minha orelha direita. E numa voz que era uma mistura de desejo e rouquidão, disse:

- Agora, por favor.

Eu obedeci. Minha mão rapidamente desceu em seus genitais. Uma sutil brincadeira na madrugada. Ouvia seus gemidos fracos, suas súplicas de prazer, suas leves mordidas na minha orelha. E eu, hábil, a brincar com seu pênis. Não muito tempo após ter começado, senti um líquido espesso escorrer pela minha mão. E Mariano soltou um suspiro de alívio, de prazer. Deu-me um rápido beijo e foi ao banheiro. Durante todo o ocorrido, eu não havia sentido nada. Nadinha mesmo. Era como se fosse uma criança entediada brincando com um brinquedo do qual menos gostava. O chuveiro foi ligado. Mariano cantava baixinho, feliz da vida por causa de uma punheta. Eu não o culpo. Ele não tem nada a ver com meus problemas.

Alias, talvez até tenha. E talvez ele seja o principal problema. Após dois anos de um relacionamento satisfatório, com altos e baixos comuns, o amor enfim acabava. Da minha parte pelo menos. Não sei o que ocasionou isso. Tento pensar, tento puxar do fundo da memória o momento em que tudo mudou. Mas não encontro a lembrança exata. Apenas que de uma hora pra outra o amor acabara.

Eu queria dizer a Mariano, dizer o quanto sentia muito. Mas não tenho coragem, ele me parece tão feliz. Logo agora que foi promovido em seu trabalho. Nós passamos por tanta coisa, por tantas barreiras, para acabar assim. Não me reconheço. Eu amava o cara que estava no banheiro. Mas agora... Sinto apenas simpatia, amizade, nem sei definir.

Enfim levanto da cama. Olho-me no espelho. Apenas uma sombra da mulher que fui. Negras olheiras manchavam meu lindo rosto. Fios brancos já começavam a aparecer. Fiquei mais magra, meus dedos parecem galhos de árvore. Então desatei a chorar, baixo pra Mariano não ouvir. Que tola eu sou. Que cega eu fui. Reconheço agora que eu percebia que o amor tinha acabado, mas não queria desistir daquele relacionamento. Eu não sei por que permaneci nessa ilusão. Então surge uma desagradável ideia.

Eu iria embora. Pra bem longe do Mariano. Ele não merecia ser infeliz ao meu lado. Por milagre, ele não saiu do banheiro enquanto eu arrumava minhas coisas. Escrevi uma pequena carta, explicando ou pelo menos tentando explicar os motivos do término. Parei por um instante na frente da porta. Tentei ouvi algum ruído dentro do banheiro, mas só havia silencio. Então um tiro ecoa pela madrugada.

Desesperadamente tentei abrir a porta, mas estava trancada e bloqueada por alguma coisa. Chutei, esmurrei, empurrei com o ombro. Nada. Procurei pelo quarto. Não tinha nenhum objetivo que me fosse útil. Os vizinhos já se acordavam. Eu chorava descontroladamente, temendo o pior. Forcei mais uma vez e percebi que o peso que estava na porta caiu. Abri, e me deparei com uma cena que nunca mais vou esquecer.
Mariano estava sentado no vaso, com a cabeça banhada em sangue. Ainda estava molhado por causa do banho, com a água descendo pelas suas pernas. Tinha um revolver que eu desconhecia a origem na mão, que repousava no seu colo. Seus olhos abertos eram apavorantes, e sua boca cheia de vísceras me causou enjoos. Sentei-me no chão, já sem forças pra chorar ou permanecer em pé. Por que ele fez aquilo consigo mesmo? Tinha uma vida toda pela frente, com um ótimo emprego e família e amigos que o amavam. Lentamente foi me aproximando do corpo, a fim de pegar um pedaço de papel que estava preso na outra mão.

Ali dizia que o motivo de sua morte era que ele não me amava mais. E ele sabia que eu também não o amava. E que só iria se matar porque não imaginava sua vida sem mim. E só. Minha vontade na hora foi socar o corpo dele. Eu não valia uma vida, ninguém vale. Ele não tinha o direito de se matar por um motivo tão banal. Então fui ver se na arma havia alguma outra bala. Não tinha. Talvez ele tenha temido que eu me matasse também, após ver seu corpo inerte. Levantei-me, com as lágrimas já secas, e fui pra janela. Era isso, eu iria me matar também. Que burro, que burro! Se ele não me amava mais, como não podia imaginar sua vida sem mim? Acredito que tinha outros motivos, ignorados por mim. Mas agora isso não importava. Iria me matar, por motivos fúteis. Pois tudo isso foi ocasionado por motivos fúteis.


Ao acordar dentro de uma ambulância, ouvia uma voz distante a murmurar palavras incompreensíveis. O enfermeiro dizia palavras de conforto, lamentando o ocorrido. Aquele enfermeiro é tão parecido com o Mariano, pensei. Então recomecei a chorar. Eu devia ter conversado com ele antes, tentado consertar mais uma vez as coisas. Mas agora era tarde demais. Iria ter esse peso na consciência pro resto da vida. Adeus ao Mariano, pois ele foi embora. E enfim levou um pedaço de mim comigo. Aquele pedaço aonde residia o amor e afeição que existia entre nós.

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