Ela não sabia identificar qual sentimento sentia naquele
momento. O caixão do seu esposo descia lentamente para cova, e ela olhava
indiferente. No decorrer das horas, várias pessoas vieram lhe falar, mostrar
que sentiam muito, que ele era um bom homem. Gente falsa. Não conhecia metade
daquelas pessoas. Amigos apareciam e falavam as mesmas coisas. Ela fingia
concordar, fingia aceitar, e novamente olhava para o caixão.
No velório, viu a face de um homem completamente diferente.
Trajava um bonito terno, e tinha os cabelos penteados. Flores estavam em volta
do morto, dando um toque estranhamente engraçado. Mas ela não chorava. Queria
chorar, mas não conseguia. Para mostrar que estava triste, ficou um bom tempo
ao lado do marido, alisando suavemente sua testa. O corpo estava gelado. O do
seu amor era quente. Os lábios estavam ficando roxos, outrora rosados e cheios
de vida. Afastou-se e se deixou rodear pelos familiares. E ela só olhava, ora
pro defunto, ora pro vazio. Sentia tristeza sim, mas sentia algo maior.
Apostava na indiferença. O que mais podia ser? Não conseguia sequer derramar
uma lágrima. O esposo fora um homem alegre, falava com todos, não tinha intriga
com ninguém. Nunca gostou de ver a esposa triste. Foi com esse pensamento que
ela esboçou um tímido sorriso.
Agora, com o caixão já sendo coberto, é que ela se permitiu
uma lágrima. Lágrima que se perdeu nas escuras areias. Não sabia explicar o
porquê de tanta frieza com seu amor. Ele fora um bom marido, bom amigo, bom
amante. O que ela sentia naquele momento, pensou mais tarde, era irrelevante.
Seu marido estava morto, e não faria a menor diferença a quantidade de pranto
ali derramada. Ele não voltaria.
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